quinta-feira, 3 de abril de 2008

Assentados


De uma forma totalmente displicente desço a ladeira de minha rua quase correndo. Esquecendo a saia curta e o vento que nesse momento transforma-se em leves rajadas.
Atravessando ruas e olhares de taxistas, chego a minha parada de ônibus.
Por um motivo óbvio, todos olham para mim.
Por que não nasci com pernas finas?
Ao mesmo tempo que balanço uma delas, puxo a saia para baixo tentando chamar menos atenção, o que piora a situação.

Após uma eternidade(para quem está atrasado) de espera, subo no ônibus e atrapalho-me toda no momento de passar na roleta. Quando eu consigo passar, o motorista dobra em uma curva fechada... jogando-me de um lado ao outro do transporte público.
Finalmente sento, numa daquelas cadeiras que ficam de costas para o motorista bem perto da porta de saída.

Tem um gordinho do meu lado lendo um livro imenso bem concentrado... já eu com dor de cabeça prefiro ficar futricando na imagem dos presentes da cena.
Certamente sou má interpretada por que estou sempre observando feições e peculiaridades.
Mas o que me chamou atenção foi uma gordinha ruiva que parou do meu lado logo a frente, bem na saída.
Ela e outro cara magrelo começam a ter aquelas discussões políticas que todos fazem a todo momento. Aquela tonalidade de exasperação e revolta explodindo no peito bufante.
A reclamação da ruiva é feita de forma mais exagerada, pois me parece que o problema atinge o seu salário... claro, o que é nosso sempre é mais importante do que é público.

De repente o gordinho ao meu lado larga a sua leitura e começa a prestar atenção na tal ruiva falante. Fixa o olhar de uma forma até brusca, sem vergonha alguma. Tá, talvez ele ache ela inteligente ou ache que ela está falando perfeitas idiotices e acabará se metendo na conversa.
Agora até eu presto atenção pra entender o final da história.

Ela subitamente para de falar, talvez tenha percebido que havia curiosos observando-na.
Eu baixo o olhar e disfarço.
E logo percebo que o gordinho não baixou o dele nem disfarçou.
Acho que eu estava enganada. Deixarei eles se olharem o tempo que for necessário.

O ônibus ficou mais apertado e chato. Então comecei a imitar o gordinho e olhar alguém. Fixamente.
Quem sabe o olhar de um ruivo retorne.